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portugal dos pequeninos

Um blog de João Gonçalves MENU

O jazigo de família

João Gonçalves 5 Out 13

 

Levei mais tempo a passear o cão do que o regime, nos Paços do Concelho de Lisboa, a celebrar o "5 de Outubro". Fora a homenagem a Raul Rego, um patriota e um homem bom, a cerimónia apenas disse respeito aos presentes. E porventura não a todos. Os jornalistas só queriam "saber" do dr. Rui Machete e foram prudentemente colocados entre baias para não maçar. Ao longe, os crónicos da CGTP reclamavam "demissão" em abstracto. O corpo diplomático, presente em peso, olhava decerto para isto com a indulgência e a curiosidade de quem contempla, por exemplo, uma alegoria folclórica ou um rito primitivo. Estão habituados. O regime, como ontem explicava Vasco Pulido Valente no Público, entrou definitivamente num registo de loucura, um novo "viver habitualmente", adaptado de Salazar, em que as falácias ditas ou sugeridas com a gravidade das grandes certezas (e das grandes mentiras), são o "programa de vida" dos principais protagonistas. Por exemplo, no parlamento, o primeiro-ministro perguntado sobre os cortes retroactivos - no sentido em que vão ser aplicados a partir dessa "fortuna" que são 600 euros a pensões da CGA que as pessoas já auferem -, respondeu que ninguém ia ser obrigado a "devolver a sua pensão" como se os seus interlocutores (e quem o seguia nos media) fossem todos parvos. Trata-se de um caminho de "divergência", e não de "convergência", entre cidadãos no qual uns (os do costume) são penalizados por toda a vida terem servido o "interesse público" que, supostamente, o "5 de Outubro" quis dignificar. Cavaco bem pode falar de "igualdade" republicana entre todos os cidadãos e de que "ninguém está acima da lei". Ou António Costa decretar que não vale tudo na política. Enganam-se. O que não falta é quem esteja, não acima, mas "em cima" da lei, sentado nela para ter a certeza que a lei nem sequer esperneia. Como em 1910, este regime aproxima-se do ocaso. Mesmo sem Rotunda (ninguém saberia onde enfiar-se nem a pé nem de automóvel), mais tarde ou mais cedo haverá uma "nova República". E a actual será devidamente homenageada, com a meia-hora que lhe foi dedicada hoje, no jazigo de família onde há muito já devia repousar.

CRETINICE COMEMOREIRA

João Gonçalves 30 Set 10

No tempo em que o país ainda era vivo, a propósito de umas celebrações camonianas, cobriu-se de grandes tarjas negras a estátua do bardo no Largo do mesmo nome. Era o que devia ser feito no 5 de Outubro por todo o lado. Não por a monarquia ter sido deposta (coitada, também já era um cadáver em férias) mas porque comemorar o que quer que seja, nas actuais circunstâncias, ressuma a um verdadeiro insulto ao "povo". Como se isto não bastasse, os bonzos da comissão das comemorações pretendem que o "povo", num transporte tão eminentemente patriótico como cretino, cante o hino às tantas horas, de norte a sul. Desculpem-me o plebeísmo, mas a isto só se pode responder com um não menos solene "bardamerda".

A "CAUSA REAL"

João Gonçalves 14 Ago 10


O semanário brasileiro Expresso consagra uma página inteira e uma coluna de outra à chamada "causa real". Parece que meio mundo do CDS - e ele já é tão curto -, a começar pelo inefável Portas, paga quotas para aquilo. Até o Nobre da AMI, e vago candidato presidencial (tão vago que é monárquico), é sócio. Preside à coisa o antigo banqueiro e agora editor de livros Paulo Teixeira Pinto. A "causa real" impressiona-me tanto como a comissão presidida por outro banqueiro, o "Arturinho" Santos Silva (como é carinhosamente tratado pela boazinha da dra. Maria Barroso), para os 100 anos da República. Uma e outra representam inutilidades que não convém repetir. Apesar da monarquia constitucional que vigorou sensivelmente durante toda a segunda metade do século XIX a o princípio do milénio seguinte ter sido porventura o menos indecente dos derradeiros regimes que se têm sucedido, o que o país menos precisa é de uma querela regimental. Para além disso, o "herdeiro", apesar de ser uma estimável pessoa, tem tanto disso como de esquecível e de politicamente nulo. E os monárquicos, salvo uma ou outra excepção, são de fugir. Quanto à 1ª República - que é o que o "Arturinho" comemora - tratou-se de uma mera ditadura urbana que precedeu a que lhe seguiu. O que Portugal necessita é de uma Nova República que aparentemente não tem ninguém para a exibir como desígnio. A "causa real", enquanto filantropia, lá terá os seus "alunos de apolo". Mas não passam disso. E, se calhar, nem sabem dançar.

AS INQUIETAÇÕES DO DR. PINTO

João Gonçalves 21 Jun 10



A "direita" mais estúpida do mundo continua enredada no seu novelo para dentro. Primeiro foi aquela coisa de tentar fazer das eleições presidenciais um "debate" de uma questão religiosa que não existe. As vozes lúcidas de D. Jorge Ortiga e de D. Manuel Clemente desfizeram o equívoco a que Policarpo deu corda. Agora é o nobre editor Teixeira Pinto, duma comissão do PSD para rever a constituição, que pretende revolver as ossadas da questão do regime, república ou monarquia, deixando em aberto, ao abrigo da ambiguidade do termo "democracia", a possibilidade de, a dar-se o caso, se restaurar a última. A constituição precisa ser reduzida e agilizada e não continuar a ser um depósito de "problemas" meramente intelectuais, sejam eles a natureza do regime ou o caminho para o socialismo. A constituição deve ser modificada no sentido de aperfeiçoar a República e não de a liquidar. O país - e a República - tem mais para fazer do que indagar os mistérios da "identidade nacional". Fique-se pelos livros, dr. Pinto, que está muito bem.

A PIROSEIRA

João Gonçalves 1 Fev 10


Cavaco fez ontem no Porto o discurso de abertura das comemorações do centenário da república (com letra pequena porque se percebeu que é mesmo a do 5 de Outubro que eles querem comemorar). Para além de citar "vultos" literários como Miguel Torga, João de Deus ou Guerra Junqueiro, Cavaco apelou a que nos enchessemos do mesmo "espírito" da falhada sargentada do 31 de Janeiro de 1891. E referiu a estafada ética que, em cem anos, ainda não apareceu a não ser na retórica do regime. O PR perdeu uma boa oportunidade para, sem complexos, deitar de uma vez por todas para o caixote do lixo da história certa mitologia republicana, "afonso costista", que só serviu para difamar a República. Sócrates, por seu lado, elogiou o "reformismo" dos ditadores do PRP provavelmente achando-se, com alguma razão, seu herdeiro natural. Que piroseira.

O CENTENÁRIO

João Gonçalves 30 Jan 10


O "centenário" da república começa a ser comemorado este fim de semana. No Porto, as hostilidades foram abertas por uma palhaçada promovida por Norberto Barroca que desceu (ou subiu, pouco interessa) uma rua por causa do "31 de Janeiro". Nada mais justo. O "31 de Janeiro" de 1891 não passou disso mesmo, de uma palhaçada em torno da "questão inglesa". Meteu sargentos, um capitão, um tenente, um alferes, actores, eminências da "cultura", afinal as quadrilhas habituais do então PRP já aí desavindas. A peripécia durou umas horas, as suficentes para hastear uma bandeira na câmara municipal e fomentar um pequeno folclore circunstancial. Tudo acabou tipicamente a tiro e em prisões várias. Como escreve Rui Ramos na História de Portugal da foto, a república destes aventureiros rebeldes ao directório do PRP «não resistiu um par de horas à Guarda Municipal» até porque a oficialidade tinha mais com que se maçar. Cavaco preside daqui a umas horas à abertura das "comemorações" que, para mim, só têm um interesse. Politicamente, a um ano de eleições presidenciais em que desejo que Cavaco se recandidate, estes festejos vêm a calhar. Muitos porventura prefeririam que fosse outro a presidir às festanças. Azar deles.

ASSIM NÃO VÃO LÁ

João Gonçalves 5 Out 09


Sem sair do tema "5 de Outubro", parece - eu não estava em Lisboa - que o presidente da "causa real", o dr. Paulo Teixeira Pinto, distinto poeta, pintor e ex-não menos distinto banqueiro promoveu uma "acção" que meteu cacilheiros e as já habituais bandeiras azuis e brancas. Desta vez agitaram-nas no Largo Camões. Esta gente não entende que não é por muito agitar ou colocar bandeiras com essas cores um pouco por todo o lado que mudam a natureza das coisas. Não mudam e, a continuarem assim, desacreditam-se um pouco mais. Qualquer regime, para sobreviver, precisa de austeridade. E a austeridade começa justamente na forma. Isabel II de Inglaterra só cedeu à vulgaridade em 1997, aquando da morte de Diana Spencer, porque o seu país era governado por um bimbo sorridente e "correcto" que inventou, na hora, a expressão mágica: "princesa do povo". Os nossos pobres monárquicos oscilam entre a seriedade a feira popular. Assim não vão lá.

UMA NOVA REPÚBLICA CONTRA CEM ANOS DESTA

João Gonçalves 17 Set 09


No Liceu Camões - uma casa respeitável onde, por exemplo, ensinaram Mário Dionísio e Vergílio Ferreira - o regime decidiu prodigalizar uma "sessão de apresentação" das nefandas comemorações dos 100 anos da República. É preciso fazer um distinguo. Não vá dar-se o caso de os meninos e de as meninas pensarem que há algo a comemorar. A 5 de Outubro de 1910 foi implantada uma ditadura de um partido, o PRP, depois Partido Democrático, que acabou dirigido por alguém - Afonso Costa - de quem Salazar viria mais tarde a dizer "fosse o dr. Afonso Costa um vulto nacional ...". Não era, de facto. Por isso essa "república" acabou como acabou. Com outra ditadura. Ser republicano - e eu sou visceralmente republicano - é outra coisa que ultrapassa a trivialidade de não ser monárquico. É, por exemplo, eleger o Chefe de Estado e conceder-lhe poderes de liderança institucional do regime. Qualquer coisa como uma Nova República.

FINALMENTE JUNTOS FORA DA YORK HOUSE

João Gonçalves 24 Ago 09


«O grande capital de simpatia dos movimentos monárquicos assenta mais na comicidade do que no saudosismo. Isto não pode ser assumido, porque não há melhor humor que o humor involuntário</a>
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Vasco M. Barreto, in Aparelho de Estado

NÃO É PRECISO DIZER MAIS NADA

João Gonçalves 15 Ago 09


«Alguns bloggers do "31 da Armada" resolveram hastear a bandeira da Monarquia na varanda da Câmara Municipal de Lisboa, de onde em 5 de Outubro de 1910 foi proclamada a República. Anteontem, dois deles - Henrique Burnay e Nuno Miguel Guedes, que por acaso conheço de O Independente - entregaram a bandeira de Lisboa (que na altura tinham removido) à PSP. Nada a objectar. Portugal precisa de imaginação. O pior é quando se levam a sério, como certa gente levou, esta espécie de "provocações". Porque, evidentemente, a ideia do "31 da Armada" não faz sentido, excepto como protesto cómico contra o actual regime, que se parece cada vez mais com o regime impotente e corrupto do "rotativismo" e do patético D. Manuel II. O "31 da Armada" não pensou com certeza que a bandeira azul e branca, que pendurou na câmara, não representava a Monarquia. Representava a Monarquia da Carta e, com ela, o défice do Estado, a dívida externa (proporcionalmente a maior da Europa) e dois partidos sem legitimidade ou função (o Regenerador e o Progressista), que Portugal inteiro desprezava. Como o "31 da Armada" com certeza também não sabe que repetiu uma cerimónia por excelência revolucionária e republicana. Da Câmara de Paris (do Hôtel de Ville) é que desde 1789 se anunciaram à França (e ao mundo) os "triunfos", que se destinavam a inaugurar uma sociedade perfeita e a salvar o Homem com maiúscula. O radicalismo português copiou isto (era, de resto, todo ele uma cópia) e a farsa do "31 da Armada" copiou a farsa do radicalismo. De qualquer maneira, para meu espanto, houve quem gravemente se perguntasse se o "5 de Outubro" não passava afinal de uma insurreição lisboeta e mesmo, ressuscitando uma velha e absurda tese, se a República não devia ser plebiscitada. O que não anuncia coisa boa para as comemorações do centenário, que se aproxima. A República de hoje não é a República Democrática (e terrorista) de Afonso Costa, interrompida durante meio século pela ditadura de Salazar e Marcelo Caetano. Confundir uma com a outra (como desconfio que vai acontecer) ou glorificar a primeira em putativo benefício da segunda só mostra ignorância (ou má-fé) e a falta do mais preliminar sentido histórico. Quanto à Monarquia, embora isso custe ao "31 da Armada" e ao meu amigo MEC, não dispensa um rei e um rei plausível (incluindo D. Manuel) é exactamente o que ela nunca teve. Ou tem.»
Vasco Pulido Valente, Público

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