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portugal dos pequeninos

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FORNICAÇÕES

João Gonçalves 29 Ago 06


Há horas felizes. Quem tropeçar na prosa mais recente de Gonçalo M. Tavares ("Água, Cão, Cavalo, Cabeça" (Caminho, 2006), na página10 depara-se com esta "pérola":

"Dois soldados, em vez de enterrarem os cadáveres dos seus amigos mortos em batalha, escaparam às ordens, e num pequeno bar, ainda com o uniforme manchado, mandam vir uma mulher – uma prostituta – e os dois sobem com ela para um quarto e fornicam-na. Um colando-lhe o pénis na boca e o outro fornicando-a por trás como fazem os cães às cadelas e os homens às mulheres ou a outros homens."

Nacos como este evidenciam duas ou três coisas muito simples sobre alguns rebentos "literários" em voga. Desde logo, a maior parte deles não tem "mundo". Só quem não tem "mundo" é que escreve "fornicar" - caramba, a literatura não é santa nem se guia pelos Evangelhos - ou "colando-lhe o pénis na boca". Nenhum escritor, nem ninguém que se preze, jamais "colou" um pénis a uma boca ou vice-versa. Só a palavra "pénis" afasta prudentemente qualquer "boca" do que quer que seja, já que lembra uma consulta de planeamento familiar em Chelas. Por outro lado, Gonçalo desconhece que, entre os animais, particularmente entre os cães, o sexo dos bichos conta pouco para a actividade mencionada. Da mesma forma que entre pessoas não existem "posições" exclusivas para, como ele pudicamente escreve, "fornicar". O tempo em que o Príncipe Fabrizio Salina produzia filhos sem nunca ter visto o umbigo à mulher, acabou há muito. Experimente Gonçalo M. Tavares, por exemplo, ler a biografia de Mary Wesley e vai ver como aprende muita coisa. Para já, só lhe peço para não nos fornicar mais o juízo com prosa deste gabarito.

17 comentários

De Anónimo a 29.08.2006 às 23:50

Isso foi apenas um lapso da "equipa redactorial" do Gonçalo.
Estou em crer que o rapaz nem chegou a ler essa parte antes da publicação...

De post-it® a 30.08.2006 às 00:47

bem metida, é caso para dizer.

De António Torres a 30.08.2006 às 01:52

eheheheh
fiquei com a seguinte dúvida literária:
quando, alegadamente (como está na moda dizer-se), um homem "fornica" por trás outro homem, sendo este, segundo parece, o sujeito passivo, o outro será o predicado, ou o complemento di_recto?

o João já informou o Gonçalinho, que foi você a pessoa que comprou o livro?

De lusitânea a 30.08.2006 às 12:29

O "escritor" alinhou numa guerra surrealista "á Solnado"...

De João Leal a 30.08.2006 às 13:51

Há dois lugares, pelo menos, de onde podem vir posts: da razão e da fúria rezinza. Este é um post rezinza. É um mau post, daqueles que se escrevem quando se está chateado ou com inveja. Só quem não conhece a obra de Gonçalo M Tavares é que não percebe que essa é a linguagem de marca do homem. Se fossem os soldados a descrever os factos, aí seria má literatura. Mas como é o narrador, não faz mal. Experimente fazer o teste com o Lobo Antunes. Verifique que todos os personagens nas suas aborrecidas vidas mentais usam o mesmo estilo de linguagem, da sopeira ao médico. ENfim, é Verão. A malta anda aborrecida. Aliás, é só por isso que comento este post assim, num tom crítico.

De Anónimo a 30.08.2006 às 14:25

Interessante ponto de vista do autor da pérola. Porque não...
"(...) ela sobe com os dois para um quarto e fornica-nos. Um colando-lhe a boca no pénis e outro fornicando-o por trás como fazem as cadelas aos cães e as mulheres aos homens (...)"
Porventura o autor não saberá o que isso é. Coitado.
Uma dúvida para além de saber se existe e quem é o sujeito passivo na fornicação, é saber como se lhe referir: é o coitado?
kk

De Anónimo a 30.08.2006 às 17:05

Quando o medo se ergue sobre o impulso de morte, os homens (pequena metáfora de nada) ajoelham-se perante quem os faz vivos, o deus sexo. O resto são por menores...

De António Torres a 30.08.2006 às 21:55

comentário ao comentário de João Leal:
quando diz - "...essa é a linguagem de marca do homem", convirá notar que ocorre frequentemente, tanto a imagem como a marca serem más.
E lá por o Lobo Antunes praticar um estilo particular "auto projectivo", digamos assim, não significa isso, necessariamente, alvará para coisa nenhuma.
Como em tudo, há quem goste e quem não goste. O Quim Barreiros, por exemplo, também tem clientes...

Eu achei o post com muito sentido de humor. Dizer-se "o rei vai nú", é coisa que rareia cada vez mais, mas faz muita falta. É um antídoto
para a complixite pequeno-burguesa que afecta muita gente por aí.

De Joshua a 30.08.2006 às 22:13

Fornicar pode de facto ser inserido num contexto bem mais expressivo e adequado que não ponha em causa a força retória pretendida. Conviria que o Gonçalo fosse mais explícito e mais rente ao solo e dissesse qualquer coisa como: «Um enfiou-lhe a piça bem no fundo da garganta, sufocando-lhe a profissão, brincando ao paroxismo mortal das asfixias, e o outro varando-lhe o cu com gula sôfrega e impiedade cega de que os cães entre si são pálida imagem».

Foi, sem dúvida, uma página negligente do Gonçalito que deve ser ainda aprendiz de uma expressividade, para não dizer de uma criatividade, que nos agarre por dentro.

Portanto, bom e pertinente post.

Joaquim

De António Viriato a 30.08.2006 às 23:22

Vergastadas bem dadas, sim, senhor. Quem pretenderá Gonçalo Tavares imitar com esse arremedo de prosa provocadora : Lobo Antunes, Luiz Pacheco, Henry Miller ou outro consagrado no género ? Parece que esse estilo foi chão que deu uvas. Ou G. Tavares escreve pornografia pura e dura ou puxe pela imaginação e pelo engenho, se quiser afirmar-se no mundo das letras! Mesmo depauperado como ele anda, entre nós, há um limite para o oportunismo.Agradece-se a advertência, para evitar um gasto de euros supérfluo nessa prosa mal aparada.

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