
Não há homens para um novo "28 de Maio", não vale a pena assustarem-se em vão. Não há tropa e, sobretudo, não há elites. Os media, que substituiram as elites, dão geralmente ao povo aquilo que o povo quer que lhe dêem. Circo e pão, embora este último não abunde por motivos de todos conhecidos. Há 87 anos o povo seguiu os militares a partir de Braga porque havia um "divórcio" entre a ditadura da República - citadina, pequeno-burguesa e praticamente limitada a Lisboa - e o resto do país. Há 87 anos começou a Ditadura, um interlúdio entre a I República, jacobina e terrorista, e o Estado Novo do Doutor Salazar e da Constituição de 1933. Não está muito estudada porque ficou entalada entre um fracasso e uma promessa que parece ser, aliás, o "mote" destes quase quarenta anos de "novo" regime. Fora as liberdades e algum conforto material agora ameaçado pelas circunstâncias que nem a Europa, minada por uma estupidez política endémica de que não se livra, consegue puxar para cima, Portugal flutua à sombra de si próprio quando começa a não haver desculpas para "este" regime. Karl Kraus, no princípio do século passado, após Sarajevo, escrevia que "o estado em que vivemos é o verdadeiro apocalipse - o apocalipse estável." Não temos guerras nem revoluções, de Maio ou outras, mas é como estamos, em modo de apocalipse estável.
Quanto ao resto, isto só demonstra a inépcia e apego ao Poder do Estado dito Novo: tanta sapiência da governação e tanta elite iluminada para produzir isto.
(PS - É fácil atribuir a Salazar o mal de tudo, esquecendo-se que, se ele fez o que fez e como o fez, foi porque as tais elites o deixaram fazer.)