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A Igreja e a Europa

João Gonçalves 6 Mar 13



«O Cristianismo modelou a Europa e o conjunto dos seus valores identitários. A despeito das cisões e heterodoxias que se produziram no seu âmbito pelos tempos fora, e não obstante a Europa ser um espaço civilizacional e cultural que se tem problematizado e posto sistematicamente em questão, os valores éticos fundamentais propostos pela doutrina cristã foram sendo espiritualmente partilhados no espaço europeu, mesmo quando houve terríveis perseguições religiosas, esmagamentos e pressões insuportavelmente totalitárias, ou quando o sombrio flagelo da guerra incendiou tragicamente o continente. Dentro do Cristianismo, a Europa católica ocupa um espaço muito vasto, predominantemente coincidente com os países do Sul, é certo, mas incluindo a Polónia e a Irlanda, bem como muitas áreas disseminadas um pouco por toda a parte nos países protestantes. Conquanto a maioria dos papas tenha sido italiana e a despeito de tudo o que possa dizer-se quanto ao jogo político internacional da Santa Sé ao longo dos séculos, a Igreja de Roma teve um papel muito importante na formação de uma identidade cristã da Europa. E desde o tempo dos Descobrimentos, participou activamente na "exportação" de valores europeus para o resto do mundo. Hoje, e sobretudo a partir de magistérios recentes como os de João XXIII e Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI, está à vista que a Europa, crente ou não crente, pelo menos no tocante ao quadro dos valores que defende, de algum modo se revê na figura desses pontífices. Lembremo-nos do ecumenismo e do diálogo com outras religiões reafirmado pelos dois primeiros em termos inovadores, ou da contribuição de João Paulo II para o desmoronamento da cortina de ferro, ou de como Bento XVI é referenciado como um paradigma do espírito europeu, procurando conciliar razão e fé, filosofia e existência, espírito cristão e tolerância. Não se pode ignorar a vocação ecuménica da Igreja, nem o conjunto de factores que podem levar o próximo conclave a escolher um papa não europeu. Os interesses da Igreja e da sua projecção no mundo irão porventura nesse sentido e essa preocupação terá de ver-se como perfeitamente legítima. Creio todavia que vale a pena propor uma reflexão sobre a íntima conexão histórica que tem havido entre a figura do Papa, a sua mensagem e o seu papel na cena internacional, e uma certa configuração, tanto espiritual como geopolítica, que costumávamos conceber como própria da Europa ocidental, isto é, como uma espécie de "supremacia" hoje em declínio. Parece que uma coisa não tem nada a ver com a outra, mas estou em crer que, se o Papa seguinte vier a ser um não-europeu, a construção europeia se tornará ainda mais difícil.»

 

Vasco Graça Moura, DN

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