Digo o mesmo todos os anos. Vale a pena comemorar a República? Não vale. Contrariamente ao que a doutrina oficial propala, o que se sucedeu ao 5 de Outubro de 1910 foi a história de uma tirania pura, centrada e liderada pelo velho Partido Republicano Português que, em pouco tempo, conseguiu a proeza de "virar" o "país profundo" e algumas das suas hostes "moderadas" contra si. Pomposas e medíocres, arrivistas e oportunistas, melancólicas e dramáticas furiosas, as notabilidades do PRP e, depois, do Partido Democrático, arrasaram às suas próprias mãos a tão prometida República e o "povo" que ela majestaticamente iria servir. A probidade, a isenção e o alheamento dos "interesses" deviam ser os pilares do poder político "democrático" que é aquilo que chamam ao que temos ou que, em momentos de maior beatitude, nomeiam de "ética republicana". Ainda há pouco, para uma Praça do Município vazia, Cavaco apelava ao apego aos "valores republicanos" e instigava o país à "confiança" e à "resistência" às dificuldades, recordando os "fracos índices de crescimento económico" e que o que "é vivido pelos cidadãos não pode ser iludido pelos agentes políticos." Disse mais: "quando a realidade se impõe como uma evidência, não há forma de a contornar." Aí enganou-se. Mal virou costas, já Sócrates estava a "explicar" as suas extraordinárias "políticas sociais" (aqueles cêntimos a mais no abono de família, por exemplo) e a garantir o nosso privativo oásis. Sócrates é hoje o herdeiro mais evidente do irrealismo da I República. Como ela, explora uma fantasia sem alternativa aparente (esqueçam a dra. Manuela), dourada por uma eficiente máquina de propaganda que as "novas " tecnologias, de mãos dadas com as "velhas" (como o caciquismo e a intolerância acrítica), ajudam a manter. A avaliar pelos "estudos de opinião" e pelos "comentadores", a malta aprecia ser mantida assim, indiferente e mansa ao que se passa. Ou seja, merecemos o PRP do dr. Afonso Costa, o Estado Novo do Doutor Salazar e isto. Viva a República.