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portugal dos pequeninos

Um blog de João Gonçalves MENU

Omertà à portuguesa

João Gonçalves 17 Jul 14

 

«As elites portuguesas não primam pela "ética republicana" e habituaram-se a conviver com uma fórmula que o Exército dos Estados Unidos usava para lidar com os homossexuais: "Don't ask, don't tell." Irregularidades? Negócios suspeitos? Favorecimento de amigos? Tráfico de influências? Não perguntem, não contem. Esta maneira de viver tem consolado todos os comensais e permitido a cada um recolher, à vez, as respectivas fatias do bolo disponível - irmãmente, como se dizia dantes. Foi este regime apodrecido que permitiu que o devotamente chamado "único banqueiro" do país - e hoje tratado como cão pelos que o incensavam - chegasse onde chegou, com o risco enorme de arrastar meio país consigo. O BPN não era um banco sistémico, o BES, pertença do Grupo Espírito Santo, é um banco sistémico. Dito de outra maneira: é como se fosse o nosso Lehman Brothers. E neste momento não se sabe o fim da história. A ideia de que o Banco de Portugal teve um comportamento exemplar - ao contrário do que se tinha passado com o anterior governador, Vítor Constâncio, relativamente ao BPN - é uma teoria que resiste tão bem aos testes de stresse como resistiu o BES durante estes anos de avaliações europeias. Em Fevereiro de 2013 - há quase ano e meio -, depois de o i noticiar o esquecimento de 8,5 milhões na declaração de impostos de Ricardo Salgado, o Banco de Portugal trata de produzir um raro comunicado em que declara toda a sua confiança em Ricardo Salgado. Sim, o Banco de Portugal tinha pedido "explicações", mas depois disso ficou muito satisfeito. Naquela peça não tão antiga assim, o governador afiança que "as informações recolhidas pelo banco não fundamentam as suspeitas lançadas pela comunicação social". Enquanto o poder de Ricardo Salgado parecia imutável, o Banco de Portugal preferiu lançar as culpas para o mensageiro. Não foi o único: este é o modo de actuar da elite portuguesa, que só se distancia dos seus quando estão mortos. O BES é o regime, a crise do BES é a crise do regime.»

 

Ana Sá Lopes, i

A Europa das normas

João Gonçalves 17 Jul 14

 

«O efeito da mercantilização da vida é, assim, o de mudar radicalmente a perspectiva que se tem sobre tudo, quer se trate da liberdade, da maternidade, da educação, da democracia, etc. Voltando ao GES, e ao BES, é talvez tempo de se perceber que o aumento desmesurado do poder da banca privada, e da sua perigosidade, na União Europeia, está estreitamente ligado à norma - que é urgente que seja alterada, ela não existe nos outros bancos centrais - que impede o Banco Central Europeu de emprestar dinheiro aos Estados e de impor, para o fazer, a via indirecta da banca privada, permitindo-lhe fazer lucros extravagantes em vez de estimular a economia real. É o que acaba de acontecer mais uma vez com a decisão de o BCE emprestar à banca europeia até Dezembro 400 mil milhões de euros, à taxa de 0,1%. Como comentou Jacques Attali, embora o BCE diga que o que pretende é orientar os bancos para o financiamento das empresas, o que na verdade faz é institucionalizar o financiamento monetário da dívida pública, com benefícios enormes para o sector financeiro e em detrimento do contribuinte, que paga, e bem, por aquilo que podia ter gratuitamente. Como se, depois de tudo o que se tem passado nos últimos anos, os poderes públicos devessem ser considerados mais incapazes de visar e promover o bem comum e o interesse da generalidade dos cidadãos do que os poderes privados. A Europa das normas obscuras tem de dar lugar à Europa das opções claras. Porque esta Europa das normas tornou-se nas últimas décadas o mundo do "não há alternativas", do que tem de ser sem se saber porquê, da necessidade sem justificação nem debate, da decisão sem legitimidade, da autoridade que não se sabe bem de onde vem mas apenas que é imperativo obedecer-lhe, dando à intimidação um papel central no discurso político. A Europa das normas só conhece as regras do cinismo, ela é em boa parte a sua consagração burocrática, o que significa naturalmente, a prazo, a completa desvitalização, ou mesmo o colapso, da própria democracia.»

 

Manuel Maria Carrilho, DN

 

Foto: AFP

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