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portugal dos pequeninos

Um blog de João Gonçalves MENU

Isto vai acabar mal

João Gonçalves 30 Abr 14

O governo do "novo ciclo", iniciado no final de Julho sob o alto patrocínio do Senhor Presidente da República e do CDS, resolveu que tudo passa no médio e no longo prazo por aumentos "sexy" (recorro a um termo caro ao dr. Lima, uma das eminências mais desejadas desses idos de Julho) de tributos sobre o rendimento dos trabalhadores, dos pensionistas e o consumo. Claro que esta terapia do "DEO ex machina" vem temperada com uma vulgata política medíocre, atabalhoada e com falsas "preocupações sociais" típicas de hipócritas profissionalizados. No fundo, mais uma vez e com bastante pena minha, parece que a relação difícil com a verdade tornou-se numa condição indispensável para o serviço público democrático. As manchetes com a "limpeza da saída" destinavam-se, afinal, a limpar as mãos à parede. Isto vai acabar mal.

Os três mosqueteiros

João Gonçalves 29 Abr 14

O Senhor Presidente da República, cinco dias após o 40º aniversário do "25 de Abril", decidiu condecorar, entre outras, três amáveis preciosidades da nossa melhor "elite": o dr. Mexia, da edp, o engº Faria de Oliveira, da Caixa, e o dr. Pedro Reis acabado de sair da AICEP e do "colo" do senhor vice PM. Não discuto a oportunidade ou, sequer, o mérito do exercício. Decerto o Doutor Cavaco saberá explicar ao país o porquê de tamanha distinção. Mesmo que o país a ignore. Sobretudo aqueles portugueses que, no activo ou em casa, novos ou "velhos", sentem o que significa uma vida inesperadamente puxada para baixo. Tudo o que as três notabilidades em causa, por natureza, desconhecem. Em matéria de simbologia política, o Doutor Cavaco acerta pouco. E a política inclui a sabedoria e a grandeza dos gestos simbólicos. Este é demasiado pequenino para chegar a ser simbólico.

Engolir o sapo

João Gonçalves 29 Abr 14

A CRESAP, como há dias num colóquio promovido por um jornal o 1º ministro "deixou cair", foi um produto consensualizado com o (para não dizer uma exigência do) PS. É, pois, natural que alguns dos eleitos, dos poucos dos escolhidos, sejam "apreciados" com reticências públicas e notórias. Quem bebe pelo gargalo, compra a garrafa. Até com sapos dentro.

Se o ridículo matasse

João Gonçalves 29 Abr 14

Mas não, não mata. Não admira que o Sérgio Monteiro - designadamente pelo trabalho político efectuado no sector dos transportes, e apesar dos louvaminheiros espalhados pelo media em louvor e simplificação do dr. Lima - apareça cada vez mais como o verdadeiro ministro da economia. Pelo menos nunca o vemos metido em palhaçadas.

Acima da "imagem"

João Gonçalves 29 Abr 14

 

«Vasco Graça Moura, que conheci, graças às guerras contra o Acordo Ortográfico, era um homem muito bem educado. Mas não era um hipócrita. Quando entrava na eterna e bendita briga interpartidária, entrava com toda a força das cacetadas verbais, em que as "cacetadas" faziam questão de nunca serem físicas. Muitas pessoas espantavam-se (ou não queriam saber) ser este o mesmo homem que escrevia, traduzia e editava livros maravilhosos. Mas era essa a maravilha dele: era convencido bastante para não querer saber da "imagem", essa palavra estúpida que substitui a igualmente estúpida "opinião pública" ou a mais foneticamente satisfatória "reputação".»

 

Miguel Esteves Cardoso, Público

Serviço público

João Gonçalves 28 Abr 14

 

Nem eu nem muito menos o prof. Maduro sabemos bem o que é que o actual governo pretende da RTP. Mas sei que aprecio serviço público audiovisual quando o vejo. E foi isso que a RTP2 andou a fazer - e talvez pudesse continuar -  a pretexto do 40º aniversário do 25 de Abril, com uma série de documentários inteligentemente construídos para televisão (não sei se houve mais): Capitão Desconhecido, Primeiras entre iguais, Terra da Fraternidade, Estética, Propaganda e Utopia no Portugal do 25 de Abril,  O Império e os Românticos Armados e Ser e Agir. Indiscutivelmente mais úteis para as chamadas "novas gerações" do que as "regar" com trivialidades.

 

Adenda: Também no cinema, a RTP 2 andou bem este Abril com um "ciclo" Elia Kazan. Este sábado passou Esplendor na Relva que um poema de Ruy Belo conseguiu "dizer" na ambiguidade perfeita dos seus versos.

 

Eu sei que Deanie Loomis não existe

mas entre as mais essa mulher caminha
e a sua evolução segue uma linha
que à imaginação pura resiste

A vida passa e em passar consiste
e embora eu não tenha a que tinha
ao começar há pouco esta minha
evocação de Deanie quem desiste

na flor que dentro em breve há-de murchar?
(e aquele que no auge a não olhar
que saiba que passou e que jamais

lhe será dado a ver o que ela era)
Mas em Deanie prossegue a primavera

e vejo que caminha entre as mais

 

O bafio

João Gonçalves 28 Abr 14

A 25 de Abril deste ano, o primeiro-ministro, ladeado pelo inexistente secretário de Estado do desporto e da juventude e pelo inventor deste, o simpático dr. Marques Guedes, recebeu em São Bento, para almoço e paleio de circunstância, uns quantos "representantes" da referida juventude. Precocemente envelhecidos pelo "peso" das "academias" e "clubes" a que pertencem, os rapazinhos e as meninas ouviram, paciente e respeitosamente, o "pensamento" do dr. Passos sobre o evento que se comemorava nesse dia. A horticultura serviu-lhe de inspiração - falou em "regar" umas coisas - à semelhança da bacterologia por causa de uma alusão ao "bafio". Passaram três dias e, de facto, o cheiro a bafio voltou a impôr-se ao quotidiano governativo com um leve toque, assaz demagógico, de gás de botija. Voltaram o "DEO", o dr. Mota Soares e a sua fulgurante "sensibilidade social", o "verde" anunciador eng.º Moreira da Silva, as "limpas e as sujas" e a "responsabilidade orçamental" que é um eufemismo para "austeridade", inventado à pressa pelo dr. Rangel, para tentar evitar maiores estragos na sua infelicíssima e bafienta "aliança Portugal". Mas, como escreve o Luís Rosa, «pior do que o eleitoralismo das medidas anunciadas é a inconsistência do discurso do primeiro-ministro. Não pode dizer numa semana que a “austeridade vai continuar” e descer os preços da luz e do gás na semana seguinte. Não pode querer aumentar o salário mínimo a poucas semanas das eleições, quando há pouco tempo rejeitava tal ideia, e pensar que o eleitorado vai a correr premiá-lo (...). O desagravamento fiscal generalizado é a principal medida que a base social de apoio da maioria espera do governo de Passos Coelho. Os cortes na despesa pública (muitos dos quais continuam por fazer) só assim têm lógica. Mas três anos após o início da austeridade a pergunta que resta é: a maioria ainda tem uma base social de apoio? Há dois grupos que Passos Coelho conseguiu alienar e que não voltarão a votar tão cedo no PSD: reformados e funcionários públicos. As medidas que incidiram sobre estes grupos essenciais padecem de um problema comum: a forma como foram apresentadas e aplicadas. Tendo em conta o peso que as pensões e os salários da função pública têm na despesa do Estado seria impossível não mexer nesses items, mas a forma atabalhoada que caracteriza a acção de Passos Coelho estragou tudo. A substituição da Contribuição Extraordinária de Solidariedade e a tabela única salarial na função pública, medidas que devem ser conhecidas esta semana, só vão agravar a relação desses grupos com o governo. Os restantes cidadãos de classe média ainda não têm razões para voltarem a votar na maioria. Veja-se o caso das tarifas sociais da luz e do gás. A descida não se aplica à classe média. Pelo contrário, os preços da luz vão continuar a subir para estes cidadãos a propósito do défice tarifário. Passos Coelho sempre pensou que os primeiro sinais positivos macro-económicos que se têm vindo a repetir desde o final do ano passado fariam com que fosse premiado pelo eleitorado. Está enganado.» O dr. Rangel lamentavelmente também.

O respeitador cosmopolita do português

João Gonçalves 27 Abr 14

 

A erudição não abunda entre nós. Por isso a morte de um polémico erudito como Vasco Graça Moura é mais uma queda. Nem sequer era preciso estar sempre com o político que ele também apreciava ser. Mas o poeta, o prosador, o cronista, o ensaísta - "Camões e a divina proporção" aí está, por exemplo, para o erguer nessa difícil arte do ensaísmo literário -, o tradutor, o editor e, sobretudo, o respeitador cosmopolita do português (e não da babugem cretina parida pelo abstruso e ilegal acordo ortográfico através do qual muitos parolos o vão "homenagear" em letra de forma) são, naquele sentido em que hoje pungentemente nos falta enquanto memória, sociedade e cultura, exemplares. Ainda há pouco mais de um mês escreveu no DN que a língua estava a ser destruída. E acrescentava: «Não conheço hoje muitos políticos que sejam a favor disso. Se falarmos de outros utentes qualificados, também não, salvas as excepções menores do costume e as propensões para a cedência do costume. E estamos a falar de Portugal. Se passarmos a Angola temos uma noção de como se pode e deve defender a língua de um país, das suas tradições, da sua cultura, das suas relações humanas e sociopolíticas, enfim, da sua identidade. Quanto ao Brasil, faz o que entende e não se sente vinculado por uma série de baboseiras que, está mais do que demonstrado, são perfeitamente inconstitucionais no nosso país. Realmente, como na salada dos pais do imortal Basílio, o acordo foi mexido por uns cegos e temperado por uns loucos.» Ficamos com a sua derradeira inquietação que fazemos nossa: «Em que ortografia vão os nossos grandes autores ser servidos nas escolas? Serão implacavelmente desfigurados pela aplicação dessa coisa sem nome?»

 

 

não és mais do que as outras, mas és nossa,
e crescemos em ti. nem se imagina
que alguma vez uma outra língua possa
pôr-te incolor, ou inodora, insossa,
ser remédio brutal, mera aspirina,
ou tirar-nos de vez de alguma fossa,
ou dar-nos vida nova e repentina.
mas é o teu país que te destroça,
o teu próprio país quer-te esquecer
e a sua condição te contamina
e no seu dia-a-dia te assassina.
mostras por ti o que lhe vais fazer:
vai-se por cá mingando e desistindo,
e desde ti nos deitas a perder
e fazes com que fuja o teu poder
enquanto o mundo vai de nós fugindo:
ruiu a casa que és do nosso ser
e este anda por isso desavindo
connosco, no sentir e no entender,
mas sem que a desavença nos importe
nós já falamos nem sequer fingindo
que só ruínas vamos repetindo.
talvez seja o processo ou o desnorte
que mostra como é realidade
a relação da língua com a morte,
o nó que faz com ela e que entrecorte
a corrente da vida na cidade.
mais valia que fossem de outra sorte
em cada um a força da vontade
e tão filosofais melancolias
nessa escusada busca da verdade,
e que a ti nos prendesse melhor grade.
bem que ao longo do tempo ensurdecias,
nublando-se entre nós os teus cristais,
e entre gentes remotas descobrias
o que não eram notas tropicais
mas coisas tuas que não tinhas mais,
perdidas no enredar das nossas vias
por desvairados, lúgubres sinais,
mísera sorte, estranha condição,
mas cá e lá do que eras tu te esvais,
por ser combate de armas desiguais.
matam-te a casa, a escola, a profissão,
a técnica, a ciência, a propaganda,
o discurso político, a paixão
de estranhas novidades, a ciranda
de violência alvar que não abranda
entre rádios, jornais, televisão.
e toda a gente o diz, mesmo essa que anda
por tal degradação tão mais feliz
que o repete por luxo e não comanda,
com o bafo de hienas dos covis,
mais que uma vela vã nos ventos panda
cheia do podre cheiro a que tresanda.
foste memória, música e matriz
de um áspero combate: apreender
e dominar o mundo e as mais subtis
equações em que é igual a xis
qualquer das dimensões do conhecer,
dizer de amor e morte, e a quem quis
e soube utilizar-te, do viver,
do mais simples viver quotidiano,
de ilusões e silêncios, desengano,
sombras e luz, risadas e prazer
e dor e sofrimento, e de ano a ano,
passarem aves, ceifas, estações,
o trabalho, o sossego, o tempo insano
do sobressalto a vir a todo o pano,
e bonanças também e tais razões
que no mundo costumam suceder
e deslumbram na só variedade
de seu modo, lugar e qualidade,
e coisas certas, inexactidões,
venturas, infortúnios, cativeiros,
e paisagens e luas e monções,
e os caminhos da terra a percorrer,
e arados, atrelagens e veleiros,
pedacinhos de conchas, verde jade,
doces luminescências e luzeiros,
que podias dizer e desdizer
no teu corpo de tempo e liberdade.
agora que és refugo e cicatriz
esperança nenhuma hás-de manter:
o teu próprio domínio foi proscrito,
laje de lousa gasta em que algum giz
se esborratou informe em borrões vis.
de assim acontecer, ficou-te o mito
de haver milhões que te uivam triunfantes
na raiva e na oração, no amor, no grito
de desespero, mas foi noutro atrito
que tu partiste até as próprias jantes
nos estradões da história: estava escrito
que iam desconjuntar-te os teus falantes
na terra em que nasceste, eu acredito
que te fizeram avaria grossa.
não rodarás nas rotas como dantes,
quer murmures, escrevas, fales, cantes,
mas apesar de tudo ainda és nossa,
e crescemos em ti. nem imaginas
que alguma vez uma outra língua possa
pôr-te incolor, ou inodora, insossa,
ser remédio brutal, vãs aspirinas,
ou tirar-nos de vez de alguma fossa,
ou dar-nos vidas novas repentinas.
enredada em vilezas, ódios, troça,
no teu próprio país te contaminas
e é dele essa miséria que te roça.
mas com o que te resta me iluminas.

O sintoma

João Gonçalves 25 Abr 14

 

À memória do José Medeiros Ferreira, homem do "código genético" da democracia

 

As "comemorações" dos 40 anos do "25 de Abril" decorreram conforme previsto. No parlamento o regime celebrou-se em torno do mesmo pastelão retórico. Salvo a filha de Camilo Mortágua, do Bloco, que é mais nova que o regime e que é realmente uma novidade, os discursos não tiveram qualquer interesse, polémica ou, sequer, "elegância" política (de "grace" em inglês). Mesmo quando o PR espevitava parte da casa - como aconteceu frequentemente com Eanes no tempo em que os governos também dependiam do Chefe de Estado - contra a outra,  "crescia" na nação. Cavaco consegue o prodígio oposto: fala, a nação praticamente ignora-o e uma maioria parlamentar aplaude-o como um dos seus, e da sua infeliz circunstância, sem verdadeiramente o "respeitar". Fora do parlamento, a associação do Coronel Lourenço encheu o Largo do Carmo e teve direito a um ex-PR, o dr. Soares, obrigando as televisões a repartir-se entre o jazigo de família de São Bento e as toleimas voluntaristas do velho capitão de Abril. Ou seja, estes 40 anos da Revolução configuraram, da rua aos corredores do poder, um conflito, coisa de que o actual Presidente foge como o diabo da cruz. Foi, no entanto, o melhor sintoma da liberdade e da democracia. A melhor homenagem.

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