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portugal dos pequeninos

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Viver dentro das nossas impossibilidades

João Gonçalves 13 Fev 14

O primeiro-ministro foi ao Tramagal dizer, e cito de cor, que "estamos a caminhar para viver dentro das nossas possibilidades". O uso do plural majestático é manifestamente irónico embora, decerto, as figuras da retórica clássica não devam ser o "forte" da formação intelectual de Passos Coelho. Quem o conhece bem, disse-me outro dia que o chefe do governo se "sente" como um evangelista de "igrejas" como a IURD (salvo o devido respeito) que, uma vez recolhido o dízimo junto dos suspeitos do costume, fica como que tomado por uma "visão" escatológica em relação à sua função de pastor milenar da pátria. Depois de ter conseguido, pelo menos na semântica, mudar o sintagma "acima das nossas possibilidades" para o "dentro" delas, Passos com certeza quer significar por "dentro das nossas possibilidades" coisas como "habituem-se a viver na nova normalidade". O que, para a maior parte das pessoas, quer dizer "habituem-se a viver com as vossas novas impossibilidades". O que é certo é que esta mistificação, mais "espiritual" que política, vai fazendo o seu caminho comunicacional - o único que interessa fazer - enquanto o mais próximo candidato a sucessor deste notável evangelista, A. J. Seguro, cercado por dentro e por fora, aparenta não conseguir sair dos caminhos na floresta em que tanto se enfiou como o enfiaram. Por exemplo, hoje os juros da dívida 10 anos andam pelos 5%, o ministro da Defesa Nacional terá confessado a um general não entender "nada" de Defesa, o glorioso perdão fiscal do final do ano terá "custado" quase 500 milhões de euros em juros, coimas e derivados, os ajustes directos de 2013 terão ficado na orla do 2 mil milhões de euros, os famosos submarinos, em 300 milhões, o arbítrio da "avaliação do desempenho" passa a poder despedir democrático-cristã-livremente, mas um pensionista que receba três dígitos líquidos de rendimento já não tem dinheiro a meio do mês para poder "viver dentro das suas possibilidades"? As "novas impossibilidades" existem porque subsistem "velhas possibilidades" do tipo das indicadas que escapam ao vocabulário da promessa da felicidade "empresarial" que não entra no plural majestático do primeiro-ministro. Talvez a escultora do regime, a grande navegadora de cacilheiros Vasconcelos, consiga traduzir este "desígnio" original para os quarenta anos do "25 de Abril". Quem, melhor do que ela, poderia representar as nossas novas impossiblidades?

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