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"Os tempos são ligeiros e nós pesados porque nos sobram recordações". Agustina Bessa-Luís
João Gonçalves 22 Jan 14
Estava a ver nos telejornais o debate do orçamento rectificativo. Rectificativo para "rectificar" a "contribuição extraordinária de solidariedade" dos pensionistas e que "poupa" cerca de 90% dos reformados, "poupança" essa que é apresentada como uma extraordinária conquista (faz-me impressão que alguém se possa louvar na miséria pura ou vagamente remediada e apresentar isso como um bem social e político). Por isso, em homenagem à "vida real" - a dessas pessoas e não a imaginada, por exemplo, pela "empreendedora" e "paradigmática" dupla Lima-Crato -, vou às execradas "humanidades" buscar versos de Vitorino Nemésio que dedico à Maria Luís Albuquerque que sei que não percebe só de finanças e que não acredito que não tenha biblioteca. E que belo, da vida e da poesia, é ver este professor reformado, então com 75 anos e a menos de dois de morrer, apaixonado por Margarida Victória Borges de Sousa Jácome Correia, de 57, para escândalo póstumo da família do poeta, "coxo e doido", "corno coxo".
Fui hoje à Caixa, Marga, receber
A pensão de reforma.
Coxo e doido, Marga. Muito!
Duro é ser velho, e, então, de ossos a arder?
A minha tíbia engole facas.
Fui hoje à Caixa receber
O troco das pernas fracas.
E lembrei-me de ti, que eras habituée
Lá pela ordem dos trinta, dos cinquenta milhões.
Da formiga à cigarra:
(Iguais ocasiões)
- Que faisiez vous aux temps chaux,
Dit-elle à cette emprunteuse.
Lembrei-me de ti com La Fontaine,
Cigarra, claro, chanteuse.
Formiga fora uma aubaine.
Marga, é tão triste o dinheiro!
Até já o ganhas, como eu,
E andaste coxa, cheia de dores
Tu que o atiravas aos punhados
Como em batalha de flores
Estás como os reformados
À espera dos directores
Mas como ainda és bonita
E há sempre um, pronto aos favores,
Vê bem o que ele te debita
Que descontos te faz
Ê provável que insista
Sabendo-te "petite amie" de um pobre pensionista
A menina bem sabe que há certas coisas que nem mesmo um aperto
(Ai, a minha peminha!)
Cornucópia - corno coxo.»
Caderno de Caligraphia e outros Poemas a Marga
João Gonçalves 22 Jan 14
«Em que ortografia vão os nossos grandes autores ser servidos nas escolas? Serão implacavelmente desfigurados pela aplicação dessa coisa sem nome? Ou virá o Governo a tomar providências rápidas para, pelo menos em parte, remediar a situação? A crítica definitiva do Acordo Ortográfico, nos planos científico, jurídico, político e sociocultural, está feita há muito, pelo que nem sequer vale a pena retomá-la. Mas torna-se necessária uma solução que, de resto, e como Pacheco Pereira também salienta, sairá tanto mais cara ao País quanto mais tarde ela for tomada. Os custos directos e indirectos serão muito altos, mas arriscam-se a tornar-se astronómicos se se continuar a perder tempo. Trata-se de uma questão também política que, pela sua dimensão internacional, requer um particular tacto no seu tratamento e cuja solução, segundo creio, poderia ser encontrada em três planos. Em primeiro lugar, o Governo poderia negociar com os editores de livro escolar, que não são assim tantos, o abandono do esquema actual de aplicação do Acordo nas edições escolares, tendo em conta o tempo de validade dos livros e manuais existentes e o seu ritmo de substituição. Entretanto, o Governo suspenderia a aplicação do Acordo Ortográfico decretada por uma Resolução do Conselho de Ministros de ultrajante memória, determinando que, na medida do possível, se voltasse já ao sistema anterior (afinal o ainda vigente, quer se queira quer não...). Em terceiro lugar, no plano internacional, seriam desencadeadas as medidas necessárias a uma revisão imediata do Acordo Ortográfico pelos oito países de língua portuguesa (incluindo portanto Timor). Estas três dimensões do problema não terão nunca uma solução satisfatória, atendendo aos malefícios já provocados e aos que se desenham no horizonte. Mas na situação em que nos encontramos, não se pode esperar que haja muitas outras saídas possíveis e esta seria certamente uma delas. Para além dos objectivos visados no curto, no médio e no longo prazo, no plano escolar deixaríamos de ter, desde já, os nossos grandes autores barbaramente estropiados por uma grafia abstrusa. E isso, agora que o ensino do português vai mudar no ensino secundário, é de uma importância primordial.»
Primeiro tem de me explicar o que é isso do “desta...
obviamente nao é culpa do autor ter sido escolhi...
Estou de acordo. Há questões em que cada macaco se...
Fui soldado PE 2 turno de 1986, estive na recruta ...
Então António de Araújo foi afastado do Expresso p...