«A Wikileaks é uma organização política, com escreveu Pacheco Pereira, e não jornalística, mas trabalha na comunicação social e tem relações especiais com cinco dos melhores jornais do mundo. A sua política é esta: mudar o mundo pela comunicação e não pela revolução. Além de segredos militares e diplomáticos dos EUA — principal alvo das “wiki-fugas” de informação —, a organização já tornou públicos documentos sobre membros de um partido racista britânico, a descarga de lixo tóxico na costa africana e corrupção empresarial, entre outros pacotes de informação. Na Islândia, a Wikileaks foi consultora do parlamento na criação de legislação que transforma o país num paraíso da liberdade de imprensa. A legislação foi aprovada por unanimidade parlamentar em Junho. Na origem da decisão extraordinária da Islândia esteve a sua crise financeira, que se deveu em parte ao secretismo em negócios de bancos. Os telegramas diplomáticos ultimamente anunciados pela Wikileaks serão, muitos deles, irrelevantes enquanto material jornalístico ou de interesse público, como aquele em que um diplomata dos EUA “explica” que Putin e Medvedev são como Batman e Robin; o “fait divers” apenas sugere que o diplomata estaria mais bem colocado na Disneyland, a fazer de Pateta. Mas alguns telegramas são de interesse público, sobre inúmeros países e regimes, como o que respeitante ao envolvimento de dirigentes no narcotráfico ou sobre o pedido de autorização para voos da CIA em território português. Nem todos os telegramas causam danos. Pelo contrário. Em Portugal, o ministro Amado pôde credibilizar a inocência do governo no caso dos voos da CIA; uma fonte do Kremlin não viu nada de mal na informação saída da Rússia. No PÚBLICO, Teresa de Sousa escreveu que os telegramas revelam que o governo dos EUA “prossegue o seu objectivo legítimo de manter a liderança americana de uma forma equilibrada, pensando no interesse americano numa perspectiva global”. Haverá maior elogio à superpotência? Enquanto organização agregadora de informação e não-jornalística, não cabe à Wikileaks seleccionar o material obtido. Se o fizesse, cairia no mesmo erro de secretismo e falta de transparência que condena nos poderes políticos e militares. Por demissão, desinteresse ou acomodação, o jornalismo tem desleixado o tipo de investigação que a Wikileaks faz. Cabe agora aos jornalistas o papel secundário de extrair dos documentos material de interesse jornalístico. Os serviços secretos ocidentais não descobriram razões políticas para que os alvos principais da Wikileaks tenham sido, até agora, os EUA e o velho Ocidente, mas a história ensina que a hipótese é valida. Alguns ex-colaboradores do site mencionaram essa obsessão. Mas, se as “wiki-fugas” prejudicam os sistemas de poder democráticos, o que, por tabela, favorece os mais fechados ou ditatoriais, não se pode condenar a revelação de documentos relevantes na esfera pública pelo facto de não haver segredos russos ou chineses na Internet. Os recentes ataques à Wikileaks por parte do sistema político-militar-financeiro americano, incluindo ameaças de assassínio, são do mais brutal contra a liberdade de expressão que ocorrem desde a 2ª Guerra Mundial no mundo democrático e constituem mais um alerta sobre o que esperar contra a liberdade nos países livres. Acresce que os EUA, como afirmou o ministro australiano dos Negócios Estrangeiros, são responsáveis pelas suas fugas de informação. Os seus sistemas de segurança revelaram-se demasiado frágeis e talvez mesmo criminosamente displicentes, se se confirmar que todos os documentos estavam reunidos no mesmo local e acessíveis para cópia por um soldado. O jornalismo deve reconhecer-se na missão da Wikileaks de investigar e dar a conhecer erros e até crimes dos poderes. Por causa dessa tarefa, por vezes corajosa e generosa, morrem por ano dezenas de jornalistas em todo o mundo. Como é possível jornalistas e comentadores portugueses atacarem a divulgação de documentos de interesse público? Até arrepia ler e ouvir alguns deles, super liberais ou de “esquerda” (porém “moderada”), condenando a divulgação de documentos pela Wikileaks e assumindo a mesma posição do poder político e militar americano.»
Eduardo Cintra Torres, Público
Adenda (de Eduardo Cintra Torres, recebido por mail):«Não mencionei no meu artigo eventuais danos causados pela Wikileaks ao divulgar "o que não devia" por uma razão simples: ainda não aconteceu. Os EUA, como lhes compete, exageram ao invocarem esse perigo para aumentarem a aura negativa da Wikileaks. A lista dos edifícios importantes parece-me um caso desses. Qualquer organização anti-americana interessada conheceria ou facilmente faria a lista daqueles edifícios. Além disso, os terroristas têm atacado edifícios que não vêm em lista nenhuma, como as Torres Gémeas e hotéis "ocidentais" em diversas partes do mundo. Nada os detém quando querem causar o mal.»
Primeiro tem de me explicar o que é isso do “desta...
obviamente nao é culpa do autor ter sido escolhi...
Estou de acordo. Há questões em que cada macaco se...
Fui soldado PE 2 turno de 1986, estive na recruta ...
Então António de Araújo foi afastado do Expresso p...