"O meu Verão passou-se em fervorosa releitura dos meus dois autores preferidos: o divino Marcel e o divino Thomas". Podia começar assim uma redacção da antiga quarta classe de um menino sobre-dotado. Nada mais enganador. A frase pertence a Frederico Lourenço, professor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, escritor e tradutor de clássicos. Vem na sua coluna habitual no suplemento "6ª" do Diário de Notícias. Lourenço adquiriu notoriedade com as suas traduções da Odisseia e da Ilíada- parece que, afinal, discutíveis - e com a sua trilogia "Pode um desejo imenso" ("Pode um desejo imenso", "O curso das estrelas" e "À beira do mundo"), tudo dos Livros Cotovia. De tal maneira que a editora pôs cá fora recentemente estes "romances" em forma de um, com o título do primeiro. Lourenço, graças à referida trilogia, a uma "autobiografia" - "Amar não acaba" - e à sua idade, tornou-se numa espécie de ícone de uma geração homossexual chique, geralmente mal resolvida e mal fodida, que se revê nos delíquios insuportáveis da sua escrita. Verdadeiramente, Lourenço integra uma categoria de escritores que praticam aquilo a que eu chamo "a escrita maricas". Esta "escola" inclui vários tipos de escrita - poesia, romance ou ensaio - e não deve a toponímia às opções sexuais de quem a pratica. Releva antes da forma como os autores e as autoras expõem as suas "ideias" (quando as têm), tornando muitas vezes rísivel ou soporífera a respectiva leitura. Aliás, e como escreve o Eduardo Pitta no único texto sério que conheço sobre a matéria, "literatura homossexual é um pleonasmo". E continua. "O que sempre houve é literatura feita por homossexuais, a qual, com carga erótica ou sem ela, não tem sido coutada de escritores homosssexuais. Jorge de Sena era heterossexual. Henry James e Evelyn Waugh são notoriamente ambíguos (a despeito da juventude sparkling do segundo). E Luiz Pacheco? Discurso directo: "Gostas de broche? - pergunto e encaro-o [...] e pela primeira vez noto como me apetecia aquele corpo, ser dono ou servo daquele aparato movediço de carne, pele, ossos, pêlos, força". Não vale a pena extrapolar, mas a figura do magala é com certeza um fantasma português." (in "Fractura, A condição homossexual na literatura portuguesa contemporânea", Angelus Novus Editora, 2003). Ou seja, tal como eventualmente a sexualidade é indivisa e só o objecto a quem ela se dirige pode ser de uma ou de várias naturezas, também não me parece que subsista uma "escrita" marcadamente sexista enquanto tal. Basta ler os romances autobiográficos de Henry Miller para entender o que pretendo exprimir ou mesmo a prosa violenta e "anti-maricas" de Jean Genet. Entre nós, onde normalmente se vive de leve, se escreve de leve e se morre de leve, como Eça dizia de Júlio Dinis, a tendência é sempre a mesma: afastar a vida e a realidade de tudo o que possa perturbar a pequena cabeça do putativo leitor. Ora a verdadeira literatura - mesmo, ou sobretudo, a de Proust que Lourenço refere - é um parto doloroso e uma morte mais do que anunciada. Não existe literatura inocente, a tal da "arcádia" a que alude Lourenço. Sem querer repetir clichés conhecidos - de Bukowski a Pasolini - toda a grande literatura tem de passar pelos "ciclos" que simultaneamente a redimem e a perdem: o do sangue, o do esperma e o da merda. Proust, que uma passagem da sua Recherche fez rir Frederico Lourenço na Meia-Praia de Lagos, fechou-se num quarto para escrever o que escreveu. Por assim dizer, saiu-lhe do coiro, da forma mais dolorosa que possamos imaginar. Não se pode falar da vida que emerge da verdadeira literatura com entrefolhos, punhos de renda ou lápis-de-cor. Frederico Lourenço podia ter terminado a sua "autobiografia" com a frase "tudo na vida tem o estigma da caducidade". Só que não resistiu à "arcádia" e perpetrou uma vulgaridade: "só amar não acaba". Um "escritor" que não entende que "amar" pode nem chegar a acontecer, é porque não sabe ler os seus "divinos" Marcel Proust e Thomas Mann.
Primeiro tem de me explicar o que é isso do “desta...
obviamente nao é culpa do autor ter sido escolhi...
Estou de acordo. Há questões em que cada macaco se...
Fui soldado PE 2 turno de 1986, estive na recruta ...
Então António de Araújo foi afastado do Expresso p...