
"Os patrulheiros", do Eduardo Pitta. Quando saiu o livro de Victor Farias sobre Martin Heidegger - significativamente traduzido por cá na
Editorial Caminho -, os patrulheiros vomitaram indignações várias contra aquele que era "só" o maior filósofo do século, quando se sabia, de diante para trás e de trás para diante, a "história" do homem. A recém desaparecida Elizabeth Schwarzkopf também levou por tabela. Consta que se "oferecia" para espectáculos organizados pelo partido a que pertenceu, o nazi, como se isso a destituísse do essencial - a sua arte - que é o que fica. Não vale a pena falar de outros, desde Richard Strauss a Furtwängler ou Karajan. O "estigma" está sempre lá. Günter Grass, por acaso, nunca me entusiasmou. Todavia, não era agora que o seu "passado", aos oitenta anos, me ia incomodar se acontecesse lê-lo. Como qualquer bom livro da história da Alemanha pode explicar, o partido nazi não nasceu por obra e graça exclusiva do cabo Hitler, nem tão-pouco precisou de grandes esforços para se implantar na sociedade da época. Milhões de alemães foram literalmente nazis e nada disso impediu que a Alemanha adquirisse, na Europa de hoje, a preeminência de que disfruta como uma grande democracia. Esta mania de dar lições de "moral e política", transformando banalidades - muitas delas amplamente conhecidas - em "escândalos", é muito própria de uma certa mentalidade esquizofrénica tida por politicamente correcta. No fundo, reduz-se tudo àquele ditado popular muito vulgarizado: "quem nasceu para lagartixa, nunca chega a jacaré".
A obra foi sublime ou superior. A vida, comandada pelos sentimentos e pelo instinto, foi medíocre.
"O estigma está sempre lá".
Concluindo: a vida foi de lagartixa a obra de jacaré. Discordo do ditado. Pode-se ser lagartixa e jacaré ao mesmo tempo.
Estudemos a obra. E também o homem inserido nas suas circunstâncias. Não ao patrolhamento. Sim às lições da História.