
"Deixei-me aprisionar nas minhas próprias cadeias, eu o menos livre de todos os homens. Oh santa vergonha, oh dor vergonhosa, desgraça dos deuses, fúria infinita, aflição eterna. Sou o mais triste de entre os homens. O que a ninguém revelei, fique para sempre não dito: é para mim que falo ao falar contigo. Quando o desejo próprio do amor juvenil me abandonou, a minha vontade dirigiu-se para o Poder: tomado por súbitos desejos feéricos, conquistei o mundo. Fui desonesto sem o saber, conduzi-me de forma desleal, concebi alianças com aqueles que escondiam fatalidades. Loge, com astúcia, seduziu-me para logo desaparecer, errante. Ao amor, contudo, não pude renunciar e, no Poder, ansiava pelo amor. Aquele que a noite engendrou, o temeroso Nibelungo Alberich, rompeu a aliança. Maldisse o amor e, através da sua maldição, apoderou-se do ouro resplandecente do Reno que lhe trouxe um poder desmesurado. Arrebatei-lhe astutamente o Anel que havia forjado, mas não o devolvi ao Reno. Com ele paguei as muralhas de Walhalla, o castelo que os gigantes edificaram e a partir do qual governei o mundo. Aquela que tudo sabe e que conhece o que outrora foi, Erda, a augusta e sapientíssima Wala, aconselhou-me a libertar-me do Anel e anunciou-me o fim eterno. Quis saber mais acerca desse fim. Porém, a mulher desapareceu em silêncio."(
continua) Tradução livre do monólogo de Wotan na 2ª Cena do II Acto de
A Valquíria no qual, de alguma maneira, o "deus-homem" conta a origem de
O Anel do Nibelungo, retratada em
O Ouro do Reno.
Imperdível.
Pena que não possamos todos dizer como Nietzsche a propos do grande escroque: aquilo foi "apenas uma das minhas doenças"