
Por sete votos a favor e seis contra, os juízes do Tribunal Constitucional deram "luz verde" à abstrusa pergunta sobre o aborto que aparecerá nos boletins de voto. Dou de barato que, desta vez, o "sim" pode ganhar. Tal como escrevi outro dia a propósito da adesão de Agustina e Lídia Jorge à causa liberalizadora - a verdadeira questão consiste em concordar ou não com a liberalização total do aborto se praticado até às 10 semanas de gestação pela exclusiva vontade da mulher - essa vitória anunciada não muda a natureza das coisas. Não muda nem a natureza da vida, nem a natureza da morte enquanto parte essencial dessa mesma vida. Neste caso, porém, ao travar-se a gestação por um meio legal transformado num contraceptivo mais eficiente do que os habituais, para além do "direito à vida" é igualmente o direito a uma morte digna que desaparece. É evidente que subsiste a "consciência" - de quem a tem - e o crime quando o método ultrapassa o limite temporal ou não se encaixa nas excepções em vigor. De qualquer forma, foi dado mais um passo no nosso (português e do mundo) glorioso caminho para a "modernidade". Força.
"Contraceptivo" parece, por definição, pressupor o impedimento da concepção. Aqui, no aborto, já há concepção. E pratica-se, já que se anda no reino dos eufemismos, a cessação deliberada de uma vida.
Admita-se que casos há em que o aborto se justifica. Seja. Mas não se lhe chame "contracepção".
Isso é fazer um belíssimo frete de branqueamento do que é, na verdade, uma morte provocada por dolosa acção humana.