
Hoje comemora-se - nos centros comerciais e nas lojas, evidentemente - uma coisa chamada "restauração da independência". Ora, salvo o devido respeito, isto assenta num enorme equívoco. O que Portugal perdeu (e reparem como passámos praticamente toda a nossa história, salvo em dois ou três momentos, a perder e da perda, agora, é que já não tornamos a sair), em 1580, foi a soberania na ordem externa. Internamente, com aquele espírito serviçal e rasteiro típico do respeitinho e do temor reverencial, manteve-se a ordem estamentária doméstica. As nomenclaturas eram recrutadas "à casa" e a nossa nobreza, que nunca se distinguiu pela nobreza de carácter (salvo, de novo, um caso ou outro), integrou a corte do rei comum sem pestanejar. Lá fora, éramos parte da Espanha que, convenhamos, naquela altura do campeonato era dona e senhora de um famoso império "onde o sol nunca se punha". Não havia, porém, soberania nacional a exibir nas chancelarias. O "1 de Dezembro" e a sequela guerreira que se seguiu visaram recuperar a soberania na ordem interna. O que é certo é que, desde aí, apenas Pombal, a monarquia constitucional e Salazar conseguiram prestigiar a soberania na ordem interna perdida em 1580. Cavaco já tinha a muleta europeia e, depois dele, os quinze anos de PS, com uma intermitência irrelevante de uma direita impreparada e imatura, só serviram para nos diminuir em todas as frentes. Um novo "1 de Dezembro" verdadeiramente restaurador seria o que nos conseguisse livrar disto. O comemorado é uma falácia.
J. Mendes